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sexta-feira, 25 de março de 2011

A autoestima e o coração...

 



Nesta semana, lembrei de uma frase que ouvi do paulistano Luiz Carlos de Oliveira há alguns anos. Em 2001, ele era um faz-tudo numa produtora de comerciais de TV: escolhia os objetos usados nas filmagens, selecionava o elenco, dirigia as cenas. Nos momentos de tensão, lançava um bordão inconfundível: "Calma, não jogue veneno no sangue". Tentava chamar atenção para o fato de que o estresse é um veneno. Um veneno mortal.

Esse conselho pode parecer o mais surrado dos tópicos de autoajuda. Vindo de quem veio, porém, adquiriu para mim outro significado. Quando o entrevistei, Luiz era a história viva da aids. Era um caso singularíssimo. Infectado no início dos anos 80, um tempo em que a doença matava em questão de meses, Luiz sobreviveu a inúmeras crises e às mais chocantes demonstrações de preconceito que os primeiros doentes enfrentaram. Sem trabalho, perambulou pelas ruas e encarou a morte várias vezes. A incrível história desse sobrevivente você pode ler aqui. Não tenho notícias recentes dele, mas espero que continue por aí, repetindo seu bordão aos quatro ventos.

Não é difícil imaginar quantas situações estressantes Luiz enfrentou em décadas de convivência com o HIV e, principalmente, com a sociedade alarmada pelo HIV. Foi capaz de sobreviver a tudo. Nas horas vagas, relaxava abraçando árvores no Parque do Ibirapuera. Acreditava que elas lhe emprestavam energia vital. Não aceitava "jogar veneno no sangue" por mixaria.

A grande arte no controle do estresse é saber identificar o que é mixaria. Superestimar a importância das pequenas chateações e dos pequenos acidentes de percurso faz a mente e o corpo sofrer. Nos últimos anos, surgiram várias evidências científicas capazes de indicar como o stress altera a fisiologia do organismo.

Li recentemente um estudo interessante, realizado pela equipe do psicólogo Andy Martens, da Universidade de Canterbury, na Nova Zelândia. O trabalho procura apontar de que forma a autoestima e o stress afetam o coração. Participaram da pesquisa 184 voluntários. Um grupo recebeu uma avaliação falsa sobre sua inteligência e sobre sua personalidade. O objetivo era elevar ou reduzir a autoestima dos participantes. Os voluntários do outro grupo anotaram, durante duas semanas, qual era a sensação deles em relação à própria autoestima. Se ela estava alta, baixa ou média.

Em seguida, os cientistas observaram a atividade do tônus vagal cardíaco de todos os participantes. Por meio da análise do tônus vagal é possível saber de que forma o sistema nervoso parassimpático influencia o coração.

Complicado, né? Calma que eu já traduzo: existem dois sistemas nervosos autônomos. O simpático e o parassimpático. Eles têm funções contrárias. O sistema simpático acelera demasiadamente as batidas do coração quando estamos diante de uma ameaça e precisamos fugir. O sistema parassimpático é aquele que reduz o ritmo cardíaco e nos ajuda a relaxar depois que o perigo já passou. Nas pessoas cronicamente estressadas, o sistema parassimpático não funciona bem. Ele fica hipoativo. Isso pode provocar doenças cardíacas e autoimunes.

Nos voluntários com autoestima mais elevada havia também mais atividade do tônus vagal cardíaco. Isso é um bom sinal. Indica que o sistema parassimpático funcionava bem. Esse é o primeiro estudo que conseguiu mostrar que uma mudança na autoestima é capaz de produzir uma mudança fisiológica imediata. O trabalho é um passo a mais na tentativa de explicar as relações entre autoestima e saúde.

Para elevar a autoestima não basta tentar pensar positivamente. O mais importante, segundo os pesquisadores, é estar cercado por pessoas (amigos, parentes, chefes) que reforçam a nossa autoestima com comentários positivos.

Baixa autoestima não provoca apenas tristeza. É um sinal de que o corpo está sofrendo. Isso pode ter sérias implicações. Muitas vezes, a baixa autoestima produz stress crônico. Ele provoca uma descarga contínua e exagerada de adrenalina e noradrenalina que pode lesar o endotélio, a camada interior dos vasos e das artérias.

Não são raros os pacientes que infartam e morrem por stress, apesar de ter todo o resto dentro dos conformes (colesterol baixo, dieta equilibrada, peso adequado etc). Se você não pretende morrer de raiva, é bom reavaliar de que forma lida com contrariedades.

Chefes sabotadores da autoestima da equipe existem aos montes. Nas piores e nas melhores empresas. Sabe-se lá por quais razões estão sempre prontos a estimular o subordinado a perder a fé em seu talento e em sua capacidade. Há mulheres, maridos, namorados e namoradas que também fazem isso. Só se sentem seguros se o parceiro perder a própria segurança.

É preciso saber filtrar essas mensagens ou, simplesmente, deixar essa gente falando sozinha. Gente assim pode roubar-lhe muito. Pode roubar o seu coração.

Autoria: Cristiane Segatto

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