"... Eu tenho cada vez mais menos respostas,
mas também tenho cada vez mais menos perguntas. Disso eu não duvido
mais: tenho cada vez menos certezas. E isso não me tornou insegura, não
me fez perder a confiança, não me fez trancar de novo o coração. Muito
pelo contrário. Quanto mais o tempo passa, eu fico menos à vontade para
alimentar dores e com muito mais preguiça de sofrer. Quanto mais o tempo
passa, menos faço por onde adiantar a morte, mais tento fazer por onde
aproximar a vida. Os fios grisalhos da cabeleira também menina da minha
alma dizem um viço que acende a vontade dos encantamentos de verdade. De verdade, entenda, é quando o encantamento realmente faz a gente sorrir.
Coisas que já me importaram à beça já
não me importam nem um pouco, enquanto aquilo que essencialmente sempre
teve importância me importa, agora, com maior espaço e nitidez. Como
deve acontecer com outros tantos aprendizes da coragem, às vezes,
cansadíssima das lições e dos recursos do método pedagógico, eu recordo
que a covardia, pelo menos na aparência, é bem mais fácil, bem menos
trabalhosa, e, claro, bem mais egoísta, eu já estive lá com mais
frequência do que ainda, às vezes, me hospedo. Mas aí, justo neste
ponto, costuma acontecer algo bem bonito: também recordo de cada flor
que veio à tona só porque tive coragem de cuidar da semente. Só porque
eu cuidei. Só porque eu não me acovardei, mesmo que tantas vezes com
todo medo do mundo..."
Autoria: Ana Jácomo
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